Para quem escreve, é inegável o desejo de ser lido. Para quem lê e ama a literatura, imagina-se que não haja problemas. Afinal, está muito mais fácil ter acesso aos livros. Temos bibliotecas, internet, compras online. Se o leitor quiser, pode ir a uma livraria e curtir fisicamente o bom e velho "folhear páginas". Mas também pode continuar em casa e pela internet aproveitar o "folhear virtual" já oferecido.
Mas pense em quem não pode enxergar? Para os deficientes visuais, não basta ter acesso à internet e às compras virtuais. É preciso que os livros adquiridos estejam num formato que lhes dê independência para curtir sua literatura, sem depender de ninguém.
Há muito poucos livros convertidos para o Braille em nosso país. Experimente ir numa dessas lojas virtuais, como a Saraiva, e faça uma busca pela palavra "Braille". Vocês vão se surpreender.
Há um esforço do governo em gerar e levar esses livros aos alunos das escolas públicas e escolas especializadas sem fins lucrativos. Isso é feito pelo Programa Nacional do Livro Didático em Braille. Mas não é suficiente. Primeiro, porque esse esforço ainda está bem longe de atingir a meta desejada. Segundo, porque não são só os alunos que necessitam ter acesso a esses livros. Há adultos deficientes que não estão nesses bancos escolares.
Uma pesquisa no site da Fundação Dorina Nowill para cegos permite que tenhamos ideia do catálogo de obras publicadas em Braille. É muito pouco. Por exemplo, ao se pesquisar por Literatura Brasileira - Contos temos apenas 20 obras em Braille e 17 em CD (wav ou mp3).
E diante desse panorama é louvável a iniciativa brasileira em propor que os direitos autorais não sejam cobrados para que se possa editar livros para os deficientes visuais sem custos.
O problema vai mais longe do que isso. Pelas regras atuais, um livro em braille só pode ser comercializado no país onde foi publicado. Por exemplo, na Nicarágua existem apenas 120 livros em Braille, mas a população não pode importar livros da Espanha.
A ideia foi lançada, isso já é um passo. Vamos ver qual será a resposta mundial.
Sobre essa proposta, leia abaixo a matéria completa que saiu na última segunda-feira, no Estadão de São Paulo.
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Brasil quer acordo por maior acesso de cegos a livros em braile
Proposta será apresentada à Organização de Propriedade Intelectual mas deve demorar para se concretizar
Jamil Chade, de O Estado de S. Paulo
GENEBRA - O Brasil vai propor na terça-feira, 26, um acordo internacional para permitir um maior acesso de cegos a livros em braile ou em qualquer nova tecnologia. A proposta, que será apresentada à Organização Mundial de Propriedade Intelectual em Genebra, está sendo comemorada pela União Mundial de Cegos, mas promete levar anos para se transformar em realidade. A ideia do governo brasileiro é de que os direitos autorais sobre obras não sejam cobrados para que se possa editar livros para os deficientes visuais sem custos.
"Essa será uma proposta revolucionária que mudará a realidade de milhões de pessoas no mundo", afirmou Richard Friend, um dos líderes da associação de cegos. Segundo ele, 305 milhões de pessoas no mundo sofrem de cegueira ou tem graves problemas para poder ler.
"O problema é que menos de 5% dos livros lançados no mundo acabam ganhando uma versão em braile ou em fitas para que se possa escutar", afirmou.
Um dos obstáculos é que, mesmo que haja um livro em braile, sua comercialização fica restrita ao país onde ele foi publicado. "Um exemplo é a situação dos livres para cegos que falam espanhol. Na Nicarágua, existem apenas 120 livros em braile, mas a população local não pode importar livros feitos na Espanha", explicou Friend. No Uruguai, apenas 40 novos livros por ano são editados.
O que o Brasil quer agora é que os direitos autorais de um livro sejam suspensos para permitir que associações de cegos ou mesmo editoras publiquem o livro em uma versão acessível. O tratado ainda permitiria que o livro fosse exportado ou importado, sem restrições. "Vamos levar esse tema adiante", confirmou o embaixador do Brasil em Genebra, Roberto Azevedo.
A proposta ocorre durante o ano que marca o segundo centenário do nascimento de Louis Braille, inventor do código para a leitura dos cegos.
"Não queremos favor de ninguém. Queremos ter o direito de ir a uma livraria e comprar um livro em braile ou uma fita cassete. Mas isso, primeiro, precisa existir em uma maior número", disse Friend.
A oposição que o Brasil sofrerá virá das editoras, que rejeitam a ideia de abrir uma brecha na lei de direitos autorais. O que temem é que, depois dessa abertura, outros pedidos também serão feitos. Já existem países que defendem que livros escolares não tenham direitos autorais.
O governo americano até agora não deu qualquer indicação se estaria disposto ou não a aceitar a proposta.
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