Fonte: Caderno Idéias do Jornal do Brasil, edição de sábado (19/07/2008).
Saiu publicado em primeira página notícia sobre a descoberta de uma residência de Machado de Assis, que todos davam por demolida, e agora por Decreto Municipal será tombada como patrimônio histórico municipal.
Digitei abaixo parte da reportagem.
Você sabe quem morou aqui?
Sobrado onde Machado de Assis viveu em 1874 será tombado como patrimônio histórico
Por Mariana Filgueiras
Das lendas que cercam Machado de Assis, uma explica o epíteto Bruxo do Cosme Velho: de tanto queimar manuscritos rejeitados numa caldeirinha, os vizinhos, estranhando o hábito, começaram a chamá-lo dessa maneira. Pegou. Bruxo do Cosme Velho também era uma forma de fazer alusão a sua prestidigitação, arte de enganar leitores e críticos com a sofisticação do talento. E o Bruxo até hoje apronta das suas. O último feitiço póstumo de Machado foi enganar os próprios biógrafos. Ao contrário do que se lamentava, nem todas as moradas do escritor foram postas abaixo. O sobrado em que viveu com a mulher Carolina na Rua da Lapa, 96 – durante o ano de 1874, antes de mudar-se para o Cosme Velho – continua de pé. O imóvel acabou de ser incluído no Decreto Municipal do Corredor Cultural e será tombado como patrimônio histórico municipal.
Completamente depredado, com a fachada pichada e a fiação elétrica clandestina escondendo os detalhes do estilo neoclássico, o casarão – que antes abrigava apenas um morador no primeiro andar e o casal Machado de Assis e Carolina no segundo – hoje é espremido por pelo menos 15 famílias, com pouco mais de 10 metros quadrados para cada. Difícil imaginar que foi ali que Machado concebeu um romance sobre a burguesia ascendente da época, A mão e a luva, publicado em capítulos na imprensa.
– Aqui está mais para O cortiço, de Aluísio de Azevedo – comparou um dos moradores atuais, o professor de português e inglês Anderson Clay Sampaio, de 31 anos, surpreso ao saber que mora na antiga residência do escritor.
A referência faz sentido. Até um andar intermediário – o popular puxadinho – foi construído em passado recente, entre o vão de um piso e outro, para acomodar mais gente. Além de Anderson, pagam o aluguel mensal de R$ 200 funcionários públicos, donas de casa, camelôs e travestis. Mais Brasil, impossível.
Só agora, 100 anos depois da morte do escritor, matou-se a charada histórica – ou o feitiço póstumo, vá saber! – que deixou a ilustre morada olvidada tanto tempo. Técnicos da Secretaria de Patrimônio Histórico descobriram que as reformas urbanas do século 20 alteraram a numeração da região da Rua do Riachuelo, da qual faz parte a Rua da Lapa. Assim, o antigo número 96 virou o atual 264, e foi ignorado pelas biografias do escritor. Que, vivo fosse, provavelmente transformaria em mais uma obra-prima o romance realista e decadente que virou a sua Lapa.
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